
Deviam ser 7 da manhã. O despertador ainda não tinha tocado.
Estes minutos que mediavam entre o meu acordar e o toque do despertador sempre
foram os melhores momentos do dia.
No verão, com o lençol aos pés da cama,
virava-me e ficava a olhar o teu corpo nu. Conhecia cada curva ligeira, cada protuberância
e cada sinal por mais ínfimo que fosse. No inverno, debaixo do édredon que nos
cobria, “lia” o teu corpo como se fosse braille e percorria-o com a ponta dos
dedos até o despertador tocar.
Nunca sabia se estavas a dormir ou se fingias, para saborear
estes momentos à tua maneira. Também teria gostado de ser lida, também teria
gostado de ser olhada da forma como eu te olhava cada manhã mas nunca acordavas
antes do despertador e se fui lida nunca o soube.
Quando o despertador finalmente tocava, abrias os olhos e virando-te
para o meu lado, encaixavas-me naquele espaço que parecia feito para mim e que
fazia a minha cabeça posar no teu peito, enquanto os meus braços se enrolavam como
que magnetizados.
Costumávamos ficar assim alguns minutos. Não nos beijávamos,
não falávamos, e o único som que eu ouvia era o bater do teu coração que me
embalava num ritmo lento.
Por vezes fazíamos Amor. Um amor diferente, mais cerimonial,
quase sagrado por ser a essa hora. Nunca soube explicar porque Amar a essa hora
da manhã, quando todos se levantavam e estavam a preparar-se para ir trabalhar,
era diferente. Só os gemidos se faziam ouvir apesar da casa vazia, como se
fossemos perturbar alguma coisa, como se estivéssemos a pecar.
Depois, levantavas-te, ainda em silêncio, enquanto eu ainda me deleitava na tua almofada, absorvendo o teu
cheiro, como se fosse uma droga.
Rotina? Sim! Mas daquelas rotinas que nos fazem sentir
vivos, que nos fazem sentir diferentes e únicos.
Hoje virei-me para o teu lado depois de sentir o vazio e
fiquei a olhar para a almofada. Já não tinha o teu cheiro, mas bastava posar a
minha cabeça na almofada fria para que, quase como um fabricante de perfumes,
os meus sentidos reconstituíssem molécula a molécula, o aroma que deixavas
nela todos os dias. Fechei os olhos e revivi em poucos segundos todos os momentos
maravilhosos que tivemos de manhã nesta cama, nesta casa.
A almofada já teve outras cabeças e o meu corpo, outros corpos, mas nunca mais tive o prazer da “leitura” nem nunca mais deixei o despertador tocar para me levantar da cama......vazia ou não.
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