VISTO DAQUI.... NÃO SEI

VISTO DAQUI.... NÃO SEI

segunda-feira, 23 de novembro de 2015

Prazer da leitura

Abri ligeiramente os olhos sem me mexer, estendi o braço como sempre fazia quando acordava e em vez do teu corpo ainda quente, senti o vazio frio do lençol.

Deviam ser 7 da manhã. O despertador ainda não tinha tocado. Estes minutos que mediavam entre o meu acordar e o toque do despertador sempre foram os melhores momentos do dia. 

No verão, com o lençol aos pés da cama, virava-me e ficava a olhar o teu corpo nu. Conhecia cada curva ligeira, cada protuberância e cada sinal por mais ínfimo que fosse. No inverno, debaixo do édredon que nos cobria, “lia” o teu corpo como se fosse braille e percorria-o com a ponta dos dedos até o despertador tocar.

Nunca sabia se estavas a dormir ou se fingias, para saborear estes momentos à tua maneira. Também teria gostado de ser lida, também teria gostado de ser olhada da forma como eu te olhava cada manhã mas nunca acordavas antes do despertador e se fui lida nunca o soube.

Quando o despertador finalmente tocava, abrias os olhos e virando-te para o meu lado, encaixavas-me naquele espaço que parecia feito para mim e que fazia a minha cabeça posar no teu peito, enquanto os meus braços se enrolavam como que magnetizados. 

Costumávamos ficar assim alguns minutos. Não nos beijávamos, não falávamos, e o único som que eu ouvia era o bater do teu coração que me embalava num ritmo lento.

Por vezes fazíamos Amor. Um amor diferente, mais cerimonial, quase sagrado por ser a essa hora. Nunca soube explicar porque Amar a essa hora da manhã, quando todos se levantavam e estavam a preparar-se para ir trabalhar, era diferente. Só os gemidos se faziam ouvir apesar da casa vazia, como se fossemos perturbar alguma coisa, como se estivéssemos a pecar.

Depois, levantavas-te, ainda em silêncio, enquanto eu ainda me deleitava na tua almofada, absorvendo o teu cheiro, como se fosse uma droga.

Rotina? Sim! Mas daquelas rotinas que nos fazem sentir vivos, que nos fazem sentir diferentes e únicos.

Hoje virei-me para o teu lado depois de sentir o vazio e fiquei a olhar para a almofada. Já não tinha o teu cheiro, mas bastava posar a minha cabeça na almofada fria para que, quase como um fabricante de perfumes, os meus sentidos reconstituíssem molécula a molécula, o aroma que deixavas nela todos os dias. Fechei os olhos e revivi em poucos segundos todos os momentos maravilhosos que tivemos de manhã nesta cama, nesta casa.

Não sei se partiste há muito, não sei se partiste ontem.

 A almofada já teve outras cabeças e o meu corpo, outros corpos, mas nunca mais tive o prazer da “leitura” nem nunca mais deixei o despertador tocar para me levantar da cama......vazia ou não.

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