
Olhei discretamente para a sua mão esquerda procurando uma
aliança enquanto escrevia algo no teclado, mas sobre o branco dos seus dedos não
havia nada.
A sua joalharia limitava-se a uma pequena pulseira
entrançada que as crianças costumam fazer para os pais. Uma filha? Uma sobrinha?
O seu cabelo castanho estava apanhado por um lápis para não
estorvar o seu trabalho. Eu sempre achei que as mulheres faziam isso como uma
mensagem subliminar para quem as vê, ou mais ainda para quem as olha. O lápis
mostra um lado despreocupado com a aparência, como se aquele aspecto fosse natural,
mas mostra também que é alguém que trabalha e não é fútil. Algo que os homens
fazem com o telemóvel, jogando um jogo ou vendo a sua pagina de facebook como
se estivessem a ler um mail importante.
Parece que estar numa esplanada sem fazer nada é proibido ou
pouco atraente.
Ela sabia que eu estava a olhar (as mulheres sabem estas
coisas) e eu nem precisava de disfarçar porque me tinha sentado virado na
direcção dela, mas não sem antes olhar para o céu como se aquela posição fosse
a única que o sol de fim de tarde permitia.
Por baixo da mesa, tinha as pernas cruzadas de forma obliqua
à minha direcção, o que a colocava numa posição que eu achava que seria
desconfortável. A saia que não era curta nem comprida deixava antever umas
pernas longas e bem torneadas.
O meu café chegou, agradeci a empregada e distraído, despejei
meio saco de açucar e mexi durante breves segundos.
Nos breves momentos em que eu baixei o olhar para o café,
ela descruzou e voltou a cruzar as pernas ao contrário; era a prova que ela
sabia que eu estava a observar.
Passaram-se alguns minutos e eu continuava sem fazer
absolutamente nada que não fosse observar, olhando de forma aleatória para
todas as mesas mas voltando sempre à mesa dela.
Finalmente. deixei sobre a mesa o dinheiro para o café e
levantei-me. Ajeitei o casado e olhei descaradamente para ela procurando um
cruzamento de olhar …. Mas nada. Saí pelo lado oposto de mãos nos bolsos,
esperando ser observado e caminhei devagar tentando dar um ar de segurança que
eu não tinha e fui embora.
Enquanto caminhava pensava que tudo não tinha passado da
minha imaginação e que ela estava somente incomodada como o facto de estar a
ser observada enquanto fazia algo para o seu trabalho aproveitando esta
frescura de final de tarde numa esplanada.Os meus ombros descaíram e apressei o passo.
Naquele momento, a Mulher terminava uma frase naquilo que deveria
ser um diário ou algo assim:
“ Ele acaba de se levantar e ir embora. Gostava de ter tido
a coragem de lhe sorrir e quem sabe, ele tivesse retribuído... Era tímido, ou
simplesmente não me achou interessante o suficiente para me dirigir a palavra
ou sorrir. O dia acabou e volto agora para o meu apartamento vazio.
Quem sabe amanhã não seja um dia mais feliz.”
Acabou de escrever, fechou o computador, arrumou os óculos e
as folhas de papel, tirou o lápis do cabelo e colocou tudo na bolsa.
Levantou-se e com o olhar baixo, saiu para o outro lado da rua…
A empregada, parada no meio da esplanada suspirou: “ Parvos”
e voltou para dentro.
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