Hoje é mais um dia como os
outros, uma página de calendário arrancada, naqueles calendários que já não se
fazem. Hoje é ontem e é amanhã, como amanhã será o mesmo dia que foi hoje e
será certamente depois.
Já não espero nada. Esperei demasiado tempo por algo que não
veio. Sempre achei que na lotaria da vida me tinha saído um bilhete não
premiado.
Nasci pobre, nasci feio, nasci longe do Mundo, nasci como se
não tivesse nascido. O Mundo seria diferente sem mim? Alguém seria diferente
sem me ter conhecido?
As Mulheres que Amei já não se lembram de mim, as pessoas que
odiei não deram pelo meu ódio. Ter amado muito conta? Amei Mulheres de forma
tão intensa que deixei de comer, deixei de dormir e quase deixei de viver. Se
ao menos elas tivessem reparado, se ao menos elas tivessem visto debaixo do meu
aspecto, a intensidade do que eu sentia, talvez … talvez elas pudessem ter-me
Amado. Mas elas não viram, não repararam sequer como eu tremia na sua presença,
não repararam como eu ficava mais feio e pobre quando apareciam tal era o Amor
que eu sentia.
Nunca soube lutar por nenhum desses Amores; limitei-me a
senti-los e a chorá-los uns após outros, e uns após outros, morreram, e eu ia
morrendo com eles. Elas, as mulheres que Amei, amaram homens tão pobres e feios
como eu e tiveram filhos igualmente feios e pobres como se fossem ninhadas.
Talvez elas não fossem o que eu imaginava e talvez não as amasse realmente, talvez fosse só a minha forma de pensar que buscava... sem buscar.
Eu limitava-,e a olhar para o meu bilhete de lotaria e lamentava a sorte de não ter prémio.O prémio de não ser feio e pobre, O prémio de ser alguém.
Com o tempo, deixei de esperar, depois lentamente, e como se
fosse uma pequena fuga, o Amor esvaiu-se de mim e junto com ele, apagou-se a
pequena chama que ainda fazia de mim um Homem. Hoje sou mais pobre e mais feio
do que alguma vez fui.
O Mundo continua como sempre, indiferente à minha presença,
indiferente à minha ausência e nele, Homens e Mulheres Amam, Amam como nunca eu
amei
.
Feio e Pobre, sobrevivo um dia após o outro e resigno-me ao
bilhete sem prémio que me saiu e onde nas costas escrevi um dia que preferia
não ter nascido.
“O que é feio e pobre, sonha com ouro a pensar
em cobre"
Esta frase foi retirada do livro de Gabriel Garcia Marquez “Amor em
tempo de Cólera"..
Florentino lutou contra a
mediocridade e foi o Amor que lhe deu asas nesse caminho. A frase que retirei
do Livro é um hino a essa Luta. Pobre e feio Florentino, sempre soube
distinguir o ouro do cobre. O fim é sublime e aconselho a quem ainda não leu, a
perder-se nas agonias de Florentino Ariza, no seu Amor por Fermina Daza.
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