VISTO DAQUI.... NÃO SEI

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domingo, 8 de novembro de 2015

O PEQUENO E O GRANDE




Um era pequeno o Outro era grande, mas eram grandes amigos. O pequeno era mais cerebral e talvez a sua estatura o tivesse obrigado a criar defesas de que o maior não necessitava no duro dia a dia da escola, da casa, do trabalho e em todas as ocasiões em que se enfrentavam com alguma dificuldade.

Eram amigos desde o tempo em que ambos eram pequenos e percorriam os caminhos da escola em conjunto, para aprender que afinal de contas, aprender não os faria sair dali e que ficariam toda a vida na aldeia.

Eram filhos de famílias humildes, de pais trabalhadores e as suas infâncias foram passadas maioritariamente na rua, nas brincadeiras típicas de aldeia. Os seus nomes e o da aldeia não importam porque poderiam ter qualquer nome e crescer em qualquer aldeia parecida com esta

Cresceram juntos, descobrindo ao mesmo tempo os prazeres dos beijos roubados, dos beijos mais longos e molhados e finalmente do sexo, normalmente rápido e desconfortável com as raparigas que iam e vinham em trabalhos jornaleiros nas quintas das redondezas.

Ambos casaram no mesmo ano e na mesma igreja. O pequeno com uma mulher ainda mais pequena e o grande com uma mulher que sem ser grande se acomodava melhor nos seus braços que as pequenas com as quais tinha namorado.

Ambos tiveram filhos, o Grande teve filhos grandes e o pequeno por mais estranho que parecesse também teve filhos grandes, maiores que os filhos do seu amigo. Talvez a genética não fosse assim tão importante afinal.

Ao longo dos tempos, o café da aldeia foi o poiso diário onde descarregavam entre bagaços e sueca, as desilusões de uma vida a que faltava o sal e a pimenta. Lá encontravam o José, o Anastácio, o Manel e tantos outros que cresceram com eles nas ruas e se fizeram homens na fábrica que empregava quase todos os habitantes da freguesia, substituindo-se ao trabalho duro do campo que foram, um a um, abandonando.

Com os anos, os filhos foram-se, as mulheres ficaram velhas e já nem o sexo tantas vezes feito sem chama, mas que lhes aliviava a alma, quebrava a rotina das semanas.

Com o fecho da fábrica veio o desemprego e a rotina passou a ser unicamente a do café. O tempo já não passava como dantes; os ponteiros do relógio tinham ficado mais pesados e moviam-se mais devagar num movimento que parecia a caminhada até casa dos seus corpos cansados depois de alguns copos: lenta, sem sentido nem direcção certa.


Hoje, o grande já não é tão grande e o pequeno é cada vez mais pequeno; as mulheres já foram e os seus funerais já são vagas memórias de mentes cansadas. 

Já nada é grande e o caminho que lhes falta é cada vez mais pequeno.


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