VISTO DAQUI.... NÃO SEI

VISTO DAQUI.... NÃO SEI

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

2018 SERÁ UM ANO BOM SE ...

Com o ano a acabar e passada a euforia consumista do Natal, chega a altura dos votos e promessas de Ano Novo. Promessas muitas vezes repetidas, muitas vezes mentidas e que valem tanto a 31 de Dezembro como a 5 de Maio.

Mais de promessas e mais que mentiras, neste final de ano, gostava de agradecer o ano que acaba. Agradeço porque vivi-o!

Vivi-o como vivi os anos anteriores? Não!

Vivi-o como vivi 2017 e como não viverei seguramente 2018. De uma forma única porque também únicos, foram os momentos que passei. Em 2018 acabaram coisas, começaram outras e continuaram muitas outras coisas.

Tento sair de cada ano mais rico que no ano anterior, mais rico de experiência, mais rico de sabedoria, mais rico de pessoas, mais rico de Vida.

Por 2017 passaram muitas pessoas, muitos lugares e muitos sentimentos, que poderão voltar ou não em 2018; Se não voltarem que venham outros que me enriqueçam e me preencham.

Chorei em 2017 e chorarei em 2018.

Ri em 2107 e rirei em 2018.

Amei em 2017 e Amarei em 2018.

Mas o melhor de tudo é que 2018 será diferente de 2017 e crescerei, em 2018, mais um pouco.

No atolado de coisas, sentimentos, pessoas, lugares, Amores e Desamores, que se vão juntando no enorme sótão que é a minha vida, sempre caberão mais coisas que irão enriquecer o espólio que vou partilhando, mas que irá comigo. 

Quando colocar alguma coisa nova lá, irei sem querer, revisitar antigas memórias, coisas esquecidas que vão ganhando pó. Mas que são a fortuna que fui acumulando há muitos anos. Uma fortuna feita de alegrias, tristezas, sofrimento, partilha, Amor e Vida, sobretudo Vida.

Se conseguir em 2018, fazer com que este espólio seja acrescido e partilhado com aqueles que se cruzarem comigo e que fazem parte da minha vida, como sempre o tentei fazer, então, 2018 será um ano BOM.


Feliz 2018. 

sexta-feira, 17 de novembro de 2017

Quarto escuro

Sonhei que estava dentro de um quarto escuro. Ouvias vozes lá fora. Ouvia barulhos que não entendia a partir do meu quarto escuro.

Tinha medo? Não… sentia-me confortável dentro do meu quarto escuro onde só entravam barulhos.

Barulhos não magoam, barulhos não ferem e era tudo que podia entrar no meu quarto escuro.

Era sempre noite dentro do meu quarto escuro e a noite é boa. A noite é boa porque na noite, nada acontece, e todos os quartos são escuros.

Os barulhos entravam pelo meu quarto escuro. Alguns deles eram vozes, vozes que chegavam sem palavras que pudessem ferir-me, dentro do meu quarto escuro.

Não havia interruptor no meu quarto escuro, não havia portas no meu quarto escuro, não havia janelas que pudesse abrir, não havia paredes no meu quarto escuro. Havia somente escuridão e barulhos no meu quarto escuro.

Não havia chaves para abrir as portas que não existiam no meu quarto escuro.
Chegaste e acendeste a luz no meu quarto escuro …. As vozes passaram a ser palavras no meu quarto que já não era escuro e saí; saí do meu quarto escuro e acordei.

O meu quarto continuava escuro e não havia palavras. O relógio dizia-me que faltava pouco tempo para ter de sair do meu quarto escuro.

Virei-me para a lado e tentei voltar a dormir para voltar para o meu quarto escuro, mas já tinhas acendido a luz e o quarto já não era escuro. Levantei-me e saí do meu quarto escuro.


Talvez esta noite possa voltar !

segunda-feira, 23 de outubro de 2017

24/10/2002

Esse dia foi marcado a vermelho no calendário, porque, como todos sabem, não gostas de cor-de-rosa.

Nesse dia, em 2002, nasceste e hoje, passados 15 anos és uma “quase” mulher com 15 anos de vida… no calendário somente.

Já passaram 5478 dias e em cada um deles foste uma surpresa, uma aprendizagem e uma luz nas nossas vidas.

Juntaste-te a nós, que já cá estávamos, e em vez de somar, multiplicaste. Se fosses boa a matemática dir-te-ia que, mais que isso, foste uma potência, mas não sei se entenderias J.
Nasceste como uma guerreira de punhos cerrados e sorriso aberto, e desde cedo marcaste o teu lugar de forma indelével nesta família e neste Mundo, e nunca foste só mais uma, foste Tu! Com as tuas idiossincrasias (podes ir ver ao dicionário), com a tua forma única de ser e com a força com que chegaste a este mundo. Enfrentaste muita coisa ao longo dos teus poucos anos, cresceste demasiado depressa mas sempre soubeste ser tu mesma e estar para além das tormentas e das tempestades.

Normalmente é o inverso, mas és e serás sempre um dos meus heróis, não daqueles dos filmes, dos verdadeiros, dos que existem, vivem e respiram fora das folhas de papel e dos ecrãs de cinema.

Já gritamos muito os dois, já choramos juntos e cada um para o seu lado, Já nos chateamos vezes sem fim, mas no final do dia, sabes que estarei sempre lá para ti onde e quando precisares e também sei que no alto dos teus 15 anos de vida, serás sempre uma âncora que me relembra quem sou e quem somos.

Nem todos te entendem ou entenderão ao longo da tua vida mas quem te conhecer bem, saberá que és e serás sempre, uma mulher com valores e princípios e com a força de um exército.

Poucos saberão porquê

Poucos saberão como

Mas nós sabemos e isso basta-nos!

Sei que os dias da “minha princesa” passarão daqui a muito pouco tempo e eu deixarei de ser o teu herói (não digas que não, porque estas coisas são mesmo assim e eu saberei viver com elas), mas estou preparado para te ver ser a mulher que deixa de ser “quase” e passa a ser efectivamente. 

Ficarei de certeza muito orgulhoso da Mulher em que te vais tornar, como já sou muito orgulhoso da filha que és!


ADORO-TE 

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Faz esta noite ser inesquecível!

Faz esta noite ser inesquecível!

Neste momento, senti o peso de mil Universos nas minhas costas e o peso de ter quem tinha ao meu lado.

Quero fazer a tua vida inesquecível desde o dia em que te vi nascer e espero que não me faltem as forças,nem o tempo, para isso !

Podias ter pedido tantas outras coisas mas nada teria a mesma força nem o mesmo peso que esta pequena frase, feita de uma normalidade anormal que me encheu a alma.

O tom? Como quem pede um gelado ou um abraço, sem levantar a voz nem as sobrancelhas, sem olhar para mim, nem olhar para o chão.

Com quem diz: “tenho frio, vamos embora” ou como quem diz «:”deixa lá”

Era já tarde …

As estrelas num céu escuro, numa praia sem ninguém e num silencio que não encontramos, foram as nossas companheiras por momentos e por momentos foste outra vez criança e eu sorri para elas... porque tu não me vias, mas sorri ! 


Se a noite foi inesquecível? O tempo seguramente o dirá, mas para mim aquela simples pergunta seguramente já o é desde o momento em que a ouvi !


segunda-feira, 13 de março de 2017

Legado

Gostaria de um dia olhar para trás e perceber que deixei alguma coisa que perdure? Será que deixar a nossa marca é assim tão importante? Será que a deixamos de todo?

Podemos deixar filhos, deixar livros, deixar musica, deixar um legado qualquer que fixe o nosso nome para mais algum tempo depois de irmos, mas seja o que for que deixamos para trás, não somo nós.

Um filho é uma pessoa que pusemos no Mundo e que ajudamos a adaptar a algo que ele não pediu, a vida. Eles ficarão depois de nós e mais tarde farão possivelmente o mesmo aos filhos deles e seguirão ou não os nossos conselhos e ensinamentos, fazendo as suas próprias escolhas. 
Nunca deixaram de ser eles, desde o momento em que nasceram, nunca serão “nós” por mais que tentemos ou queiramos. Deixaremos o nosso nome, se for caso disso, no final do nome deles, mas não ficaremos através dele. 
Não são um legado que deixamos, são pessoas que herdaram de nós aquilo que fomos capazes de dar, bom ou mau e que vivem a sua vida individual, como vivemos a nossa; com escolhas, com más decisões e mais boas decisões se tiverem sorte.

Um livro escrito deixa um nome na capa e deixa no interior um pedaço de quem somos ou talvez não. 
Existe talento que não depende da Alma e livros que não são mais que o resultado de um longo processo criativo aprendido e amadurecido que põe no papel aquilo que as pessoas querem ler. Queremos acreditar que está lá o autor mas não é assim e o que fica é só um nome numa ou em muitas capas. Claro que os mais puristas dirão que cada livro é um pedaço do seu autor, mas um livro é menos que isso. Um livro é um pedaço de um pedaço da vivência do seu autor e nunca será mais que isso.

Falemos de Musica, de Cinema, de cidades inteiras, de países ou até de guerras … nada nos deixa ficar para trás, nada nos impede de irmos e de simplesmente deixarmos o nosso nome como marca máxima no Mundo onde já não estamos. Crer em mais que isso é iludir-nos e fantasiar sobre imortalidade.

Por isso não faço questão que o meu nome perdure, simplesmente porque eu não vou perdurar; gostava que fosse lembrado, gostava que as pessoas soubessem pelo menos durante algum tempo mais, quem eu era e gostava que aqueles que Amo ficassem com algo de mim que seja positivo e os ajude a construir o seu “Eu”. 

Mais do que isso é pedir algo parecido com a Imortalidade e a Imortalidade é muito aborrecida.

Para aqueles que se perguntam: qual é o sentido da vida? Porque estamos cá? Respondo que o sentido da vida é a própria morte. A vida só tem sentido se tiver um fim, senão não tem razão de ser. Se tivéssemos a eternidade para acertar e para fazer o correcto, deixaríamos sempre para depois porque teríamos tempo, demasiado tempo para errar. 


Sem Morte, a Vida seria a própria Morte. 

segunda-feira, 6 de março de 2017

Sonho

7 da manha.

O despertador diz-lhe que se tem de levantar mas o seu corpo diz que não. Mais uns minutinhos pensa … só mais uns minutinhos.

Na cabeça confusa entre a noite e o dia, as boas sensações da noite sonhada ainda se sobrepõem à realidade do dia que começa; e é neste limbo entre a realidade e o sonho que passa os minutos que separam o primeiro toque do despertador do que agora se faz ouvir e que obriga o seu corpo a reagir, ainda que devagar.

Com uma mão levanta a roupa da cama e com a outra desliga aquele barulho ensurdecedor.

A pouco e pouco o sonho vai desaparecendo da sua mente, apagando-se como se apaga uma música, baixando lentamente o volume, até não ficar sequer a mínima lembrança do que lhe provocou aquela sensação de paz e de bem-estar.

Está frio.

A água quente do chuveiro acorda-a definitivamente enquanto o café está já a perfumar o pequeno apartamento.

Depois de vestir umas calças e uma camisola leve de verão, vai à cozinha, descalça, seguindo o aroma do café que começou a ser feito à hora marcada.

Acende um cigarro e com uma chávena na mão, vai até à janela ver o dia a começar finalmente a ser dia. No prédio em frente ao dela, as luzes já acesas desenham uma espécie de palavras cruzadas sem soluções. Sorri a pensar em palavras que coubessem naquelas luzes acesas.

O corpo vai arrefecendo depois do banho quente e o frio volta enquanto o café quente se acaba na chávena grande, que segura com as duas mãos.

É neste preciso momento que lhe vem tudo outra vez, como um flash, o sonho que lhe encheu a noite e do qual acordou em paz.

Relembrou as pessoas, os locais e sobretudo lembrou-se dele. Ele estava lá, com aquele sorriso que tantas vezes lhe encheu a alma, com aqueles olhos cor de amêndoa que pareciam conter um universo dentro deles.

Ela lembra-se do sorriso e do riso; ela lembra-se do cheiro; ela lembra-se dele como ela era antes de tudo acontecer. Era sempre assim no sonho, tinha sido assim muito tempo, na Vida.

Hoje, ele já não está e visita-a por vezes nos seus sonhos e no entanto, cada vez menos quando está acordada. O tempo vai apagando a dor e a falta, mas não apaga a memória nem as lembranças. As visitas são mais raras porque a vida continua e a dor deu lugar à saudade. A dor é contínua mas a saudade vai e vem como uma brisa fria numa noite amena. Vai e vem, vem cada vez menos e vai cada vez mais.

Hoje faria anos, hoje seria um dia feliz, hoje seria outro dia diferente do dia que vai ser hoje porque hoje, ele não está.

Volta para a cama e tapa-se com os cobertores; chora, chora como já não chorava há algum tempo. Chora em silêncio. Não chora de dor porque a dor já se foi, chora porque sim, porque lhe apetece chorar e tenta voltar a sentir debaixo dos cobertores, o que sentia há pouco quando de lá saiu. Mas a sensação não volta, nem com o calor dos lençóis, nem com as lágrimas.


Ele voltará quando lhe apetecer ......como sempre voltou ..

terça-feira, 28 de fevereiro de 2017

Nos trilhos

Nos trilhos de uma vida existem muitas saídas falsas, muitas saídas de emergência, muitos caminhos errados mas também muitos caminhos correctos, só não existem locais para inversão de marcha porque tal como um ponteiro de relógio, a vida só tem um sentido.

A decisão de seguir pela direita ou pela esquerda é muitas vezes tomada sem a consciência que é uma decisão mas antes uma não decisão. É um deixar andar que nos faz seguir o caminho aparentemente mais fácil, menos íngreme.

Hoje olhando para trás, teria possivelmente tomado outras decisões, seguido outros caminhos e não sei onde me teria levado esta vida, que hoje me tem aqui neste local a escrever sobre os seus caminhos.

É irónico que hoje escreva aquilo que possivelmente nunca teria escrito se tivesse tomado outras decisões. Talvez escrever seja também uma decisão que é por si só, um caminho.

Num dos caminhos que não terei seguido estaria a minha felicidade completa, ou o desastre total ?

Nos caminhos que segui estavam as coisas e as pessoas que hoje me preenchem a vida e que fazem de mim aquele que sou hoje.

Nos caminhos que segui perdi coisas, perdi pessoas e perdi Amores; perdi de todos eles, pouco ou muito, mas foi nesses mesmos caminhos que antes os encontrei e os guardei.

Caminharam comigo algum tempo como sempre acontece e depois seguiram caminhos diferentes; alguns mais fáceis, outros muito mais difíceis e nesta teia de caminhos talvez um dia reencontre algumas das coisas que perdi.

 Mas nesses mesmos caminhos, enquanto perdia, ganhava coisas, ganhava pessoas e ganhava Amores.


A vida é isto, é caminhar, trilho após trilho, caminho após caminho, largando lastro como os balões, para poder voar mais alto, olhando para trás de vez em quando, porque é daí que vem a força que nos empurra para ir mais longe e nos move a cada dia, a cada caminho e casa encruzilhada.

Que Queres ?

- Como te chamas?

- …..

- OK, tanto faz. Afinal o nome é só alguma coisa que te deram quando nasceste e não faz de ti quem és.

- …..

- De onde vens?

- ….

- Concordo. De onde vens também não faz diferença. O lugar onde nasceste não importa, nem faz de ti quem és.

- ……

- Que idade tens?

- …..

- A tua idade só importa na medida em que viveste mais ou menos mas não faz de ti quem és.

- …….

- Quem são os teus pais?

- …..

- Para o bem e para o mal os teus pais fizeram de ti, uma boa parte de quem és. Mas também é verdade que és quem és e não és “eles” e eles não fazem de ti quem és.

-…..

- De que cor é a tua pele?

- …..

- Preto, branco, ou qualquer outra cor não interessa. A cor da tua pele não faz de ti quem és

- …..

-Qual é a tua religião?

-….

- Não interessa se não és crente ou se acreditas em Deus, Alá, Jeová ou até se adoras o Sol. Isso não faz de ti quem és.

- …..

- Que queres?

-….

- Isso, tens de me dizer ! O que és,faz-te querer o que queres e o que queres, faz de ti quem és. Se não sei o que queres não poderei saber quem és.

Olhou à espera de uma resposta que não vinha, escutou o silêncio que se fazia ouvir e fechou os olhos.


Lentamente aquela sombra ia se afastando e ele olhou mais uma vez para ele mesmo, mais novo, muito mais novo, à procura de saber quem era e pensou que talvez, talvez amanhã, ele lhe responda.

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

O nome dele

Há talvez mais de 20 anos que frequento aquele supermercado. Mudou de nome, mudou de produtos, mudou a facilidade de estacionar, mas ficou o hábito de ir lá e quando por alguma razão vou a outro lado sinto-me fora de casa; os mesmos produtos parecem diferentes, menos apetecíveis, as pessoas menos simpáticas.

Desde há uns 15 anos, nesse supermercado,  o mesmo arrumador, quase religiosamente, vem ter comigo quando eu chego. Sabe que nunca lhe dou nada antes de sair do supermercado mas sabe que lhe dou sempre alguma coisa. Terá entre 40 e 50 anos escondidos debaixo daquela barba e sujidade que lhe esconde a idade.

Quando chego cumprimenta-me, diz algumas banalidades sobre o tempo ou sobre política e depois de eu estacionar, vai á sua vida, ajudar outras pessoas que chegam. Mostra ter alguma cultura e seguramente teve uma boa educação que se lhe revê em pequenos detalhes.

No final, sempre educado, espreita a minha saída e seja carrinho de compras ou sacos, vem a correr ajudar. Recordo a minha filha chateada, numa fase em que ela ainda queria ajudar e trazer os sacos leves que eu fazia para ela, ficar aborrecida porque ele não a deixava chegar ao carro com eles.
Eu explicava-lhe que ele queria justificar o dinheiro que eu lhe dava no fim, antes de entrarmos no carro e antes de ele mandar parar o trânsito, qual polícia, para eu sair do estacionamento.

Já o apanhei mais alcoolizado que o normal e nesses dias não lhe dei dinheiro, dando-lhe antes algo para comer. Já conversamos sobre muitas coisas, sempre a correr. Ele já me contou que de vez em quando os pais o vêm buscar e colocar numa clínica de reabilitação de onde ele volta outra vez para a entrada do supermercado que é onde se sente "livre". 

Fizemos um pacto há algum tempo em que eu só lhe dava dinheiro uma vez por semana e ele vinha ter comigo na mesma, nos outros dias, dizendo: “- Eu sei! Já me deu esta semana, mas ajudo na mesma. Você é um gajo porreiro.”

Por vezes conta-me das suas aventuras das noites frias de inverno que não sei onde passa.

Quando falta alguns dias preocupo-me e fico atento a ver se o vejo nas minhas idas ao supermercado. 

Se passo por lá por outra razão, levanta a mão e diz bom dia com um aceno e um sorriso falho de muitos dentes.

Uma vez esteve internado 15 dias e quando voltou, foi com alívio que o vi vir na minha direcção. Perguntei o que se tinha passado e ele contou-me da sua pneumonia ainda mal curada, na rua e no álcool.

Cumprimenta-me por vezes com mãos tão sujas que fico a olhar para elas a pensar onde andaram mas nunca tive coragem de lhe negar um aperto de mãos quando ele a estende.

É uma presença familiar num local que frequento há muitos anos e tenho a certeza que ele sente o mesmo.


15 Anos, centenas de pequenas conversas, centenas de vezes em que lhe dei dinheiro sem esperar que ele o pedisse e no entanto, hoje, quando saia do supermercado, qual cliente VIP, com direito a paragem de trânsito e num dia em que ele falou da morte do Mário Soares enquanto punha os sacos no meu carro, reparei que nunca lhe tinha perguntado o nome …..

LAÇOS

Por vezes julgamos, definimos ou avaliamos as relações por sentimentos: Amamos, gostamos, odiamos, aturamos, respeitamos, etc..

A variedade de sentimentos é grande e a variabilidade dos mesmos ao longo do tempo também é grande. Hoje gostamos, amanhã amamos e talvez daqui a uns anos odiemos. O que sentimos em relação a uma pessoa é algo de passageiro, efémero por vezes, demorado em alguns casos, mas nunca definitivo. 

O que dois idosos sentem um pelo outro no final de uma vida em conjunto não é seguramente igual ao que sentiram quando muitos anos antes eram ainda vigorosos amantes ou quando, recuando ainda mais no tempo, trocavam os primeiros beijos.

O que distingue realmente uma relação são os laços, uma palavra que em português não tem o peso que tem noutros línguas. “Laço” é o laço de uma prenda ou o laço de um cordão de sapato e não as amarras que unem duas pessoas para sempre.

Quando dobramos uma barra de ferro até um certo ponto, ela volta ao seu formato original, se dobrarmos um pouco mais, a dobra ficará para sempre.

Quando existe um laço entre duas pessoas, passa-se a mesma coisa e é nesta altura que a relação atinge um ponto de não-retorno.

Quando nos une um laço com outra pessoa, as coisas mudam para sempre. As diferenças, aquilo que não gostamos ou gostamos menos, os gestos, as desilusões e tudo aquilo que faz parte de uma relação passam a estar dentro do “laço”. Um desgosto passa a ser só um desgosto e não um Adeus. Uma desilusão traz vontade de mudar e de fazer o outro mudar mas tudo fica dentro do laço.

Quando a soma de todos as desilusões e desamores obriga a uma separação, a dor é mais forte porque entre eles há um laço e este laço ficará. O Adeus não é um verdadeiro Adeus, mas antes, um até já. Estarão juntos noutro registo e com outros sentimentos ou talvez só juntos na ausência física um do outro, mas sabem que o laço está lá

Pode haver retorno no sentimento mas ficarão ligados para sempre. Nesta fase, o “eu” e o “tu” passam a ser “nós” e fundem-se. Poderão não ser um casal daqui a algum tempo, poderão não ser um “nós”, como os definimos normalmente, mas nunca mais serão um “eu” e um “tu”.


Acredito que ao longo de uma vida e no que a relações amorosas diz respeito, criamos muitos poucos laços por mais que amemos. Alguns terão criado um único laço e sentir-se-ão felizes com isso, outros terão criado dois ou três e serão igualmente felizes. Os Amores vão e vêm, esquecem-se e desvanecem ao longo de uma vida mas os laços ficam para sempre.