Ela estava deitada na cama e pelas frestas da persiana adivinhava a chegada do dia. A escuridão da noite dava lugar, lentamente, a uma claridade ténue que, pouco a pouco deixava ver as sombras do quarto.
As roupas espalhadas pelo chão pareciam parte de corpos inertes, actores mortos de uma peça de teatro trágica no último ato.
Só que naquele momento as cortinas não iriam baixar, nem a peça terminaria. Neste teatro, a peça estava a meio.
Ela sentia-o a seu lado, ouvia-o respirar mas não ousava virar-se, nem sequer mexer.
Fechou mais uma vez os olhos, esperando que quando os abrisse de novo, estivesse noutra peça; numa peça em que estava sozinha e acordava, como todos os dias dos últimos meses, sozinha.
Queria tomar um café, espreitando pela janela o início de dia, vendo crianças a sair de casa ensonadas, de mochilas às costas, arrastadas pelos braços de pais, atrasados para o trabalho.
Queria tomar um banho e sentir a água quente a percorrer-lhe a pele enquanto o vapor se acumulava como nevoeiro.
Queria aquela vida que ontem não queria, quando decidiu encontrar-se com um desconhecido.
Na rifa da aplicação do seu telemóvel, saiu-lhe um homem com bom aspecto e de conversa agradável; nesse mesmo dia, tomaram um copo num bar afastado, na mesa do canto. Ele dizia ser solteiro e ela não se importava de acreditar.
Não era romance que ela queria.
Ele falava mas mais que as suas palavras era a sua voz que importava; era tranquilo, seguro e com dentes bonitos.
Enquanto ele falava de si, da sua vida, falsa ou verdadeira, pouco importava, ela olhava para os seus olhos, para a sua boca e para as suas mãos.
Imaginava-se numa cama com ele e tudo lhe parecia bem, normal.
Há meses que não sentia o toque de uma pele que não fosse a sua, o toque de um sexo que não fosse o seu. Precisava de se entregar, precisava de se perder e perder, nem que fosse por minutos, a consciência de quem era e de onde estava.
Quando ela saiu para o encontro, estava nervosa mas quando saíram do bar estava tranquila e assim ficou quando o levou para casa dela.
Não falaram muito e quando as roupas começaram a espalhar-se no cão do quarto, ela deixou-se ir nas mãos de este amante de ocasião, sem reservas, sem medos.
O sexo foi bom. Ele sabia o que fazia e ela gostou que ele soubesse. Como numa dança ele conduziu e ela dançou com ele, seguindo o ritmo e os seus passos. Quando acabou, ele foi à janela fumar um cigarro e ela foi tomar um banho.
Voltou e deitou-se na cama esperando que ele fosse embora. Ela não conhecia o protocolo, as regras de encontros fortuitos e ficou a observá-lo com os olhos semicerrados fingindo um cansaço que não existia como fingira o ultimo orgasmos para acabar.
Ele deitou-se ao seu lado e encaixando-se, passou-lhe o braço à volta do corpo, pousado sobre o peito. Passaram muitos minutos sem que alguém falasse até que ela sentiu a respiração mais lenta e cadenciada e percebeu que ele estava a dormir.
Foi neste momento que ela sentiu um vazio enorme. Queria que aquele momento tivesse terminado quando terminou o sexo e que ele tivesse ido embora.
Agora passadas umas horas, sem que adormecesse, e de costas viradas para ele ela pensou que nunca mais faria isso, que não valia a pena o vazio no final.
Ela queria romance, queria Amor, queria partilhar a cama e não o sexo. Queria ter vontade que a pessoa ao seu lado ficasse para o resto do dia para o resto da sua vida. O vazio que ela sentia não valia o que tinha sentido naquela noite.
Ele acordou pouco depois e ela fingia dormir ainda. Ele vestiu-se em silêncio e foi embora. Ela adormeceu finalmente.
O dia passou tranquilo.Ela conseguiu tomar o seu café à janela e depois um banho demorado. Mais tarde saiu para a realidade do dia e mergulhou nos barulhos da cidade como sempre fazia.
No final do dia, ao entrar no carro depois do trabalho, e sem pensar duas vezes, pegou no tlm; “ Que se f… !!” pensou, Mas este não dorme lá.