Foi num
aeroporto, misturado na linha das pessoas que esperam os seus, vindos de longe;
um dia de chuva e frio que se sentia, mesmo naquele ambiente aquecido, a luz
era cinzenta naquela manhã de inverno.
Eu
era um elemento estranho que esperava quem não conhecia; eras, ainda, umas fotografias,
umas palavras trocadas, uma imagem que se foi formando ao longo de 3 semanas, 3
meses ou 3 anos. Serias real? Serias uma sombra da imagem que eu projectava?
Naquele
momento, filhos esperavam pais e corriam na sua direcção quando os viam. Pais esperavam
filhos com os olhos humedecidos pela saudade. Cruzavam-se várias línguas naqueles
poucos metros quadrados. Eu, ao contrário de todos, esperava quem nunca tinha
visto, quem nunca tinha tocado. Não tinha placa com o teu nome, só a tua cara
na minha cabeça, e a cada minuto, o meu coração batia mais rápido enquanto via
a sucessão de pessoas a sair, buscando o olhar familiar de quem os esperava.
Passados
minutos ou horas, sei lá… vi-te chegar… levantaste a cabeça por um instante e
viste-me; sorriste e voltaste a por os olhos no chão. Estavas linda! Eu estava
nervoso, enquanto tentava encontrar a pose certa, quando não havia pose certa.
Como esperamos alguém que não conhecemos mas de quem já gostamos? Não existe em
nenhum manual.
Era
uma experiência nova para mim, para ti e acredito que para quase todas as
pessoas.
Dois
beijinhos na face.. Não era apropriado.
Um
beijo nos lábios… demasiado.
Dar
a mão.. Seria desconfortável.
Um
abraço pareceu a coisa certa.. Amigos abraçam-se, amantes abraçam-se,
familiares abraçam-se e até desconhecidos se podem abraçar.
Deste
abraço recordarei sempre o calor e o cheiro. Não foi demasiado apertado nem
demasiado ligeiro como poderia ter sido. Foi um abraço em que pela primeira vez
nos sentimos, tu, com a cara escondida no meu peito, sem jeito, como dizes, e
eu com a cabeça enfiada no teu cabelo a sentir o bater do teu coração, compassado
e rápido e a misturar-se com o meu.
Foi
demorado, menos pela vontade do abraço que pelo embaraço que seria, sair dele e
termos de falar pela primeira vez.
Saíste
dele para voltar a enfiar os olhos numa chávena de café gigante e intragável de
onde de vez em quando fugias para esboçar um sorriso que logo me cativou e onde
fiquei preso até hoje.
Não
sei o que dissemos, nem sequer é importante. Tínhamos ambos medo, medo de estarmos
enganados, mero da hora seguinte, medo de termos que falar. Éramos íntimos
estranhos se isso é possível e essa mistura que tinha sido fácil de gerir até
esse momento passou a ser uma montanha para escalar.
Entre
esse momento e o abraço seguinte, junto ao mar, passou uma eternidade e foi
logo aí que o tempo começou a ter vontade própria… até hoje.
Esse
abraço foi inesquecível. Encaixamos como a última peça de um puzzle gigante.
Parecia que tínhamos sido moldados por um escultor, para que, cada saliência de
um, encaixasse na perfeição no espaço do outro.
O
frio do vento que vinha do mar era compensado pelo calor na alma e foi assim que
senti pela pela primeira vez a certeza que havia algo mágico neste encontro de
duas pessoas que tinham tudo para nunca se cruzarem.
Durante
muito tempo foi “só”um abraço, uma troca de cheiros como dois animais; daqueles
momentos únicos em que deixamos de ser quem somos e quem fomos e voltamos ao
mais básico da humanidade, sem filtros, sem apetrechos.
Estávamos
nus, nus da alma e do ser. Não era suposto beijarmos-nos mas o toque do meu
lábio no canto do teu, enquanto te desviavas, teve o sabor de mil beijos. Mil
beijos ainda não trocados mas que sabíamos que iam ser maravilhosos.
Quando
senti finalmente o sabor da tua boca, os teus lábios húmidos, foi como se essa
boca, essa língua e esses lábios tivessem sido meus desde sempre. Beijamos como
dois amantes se beijam, como duas bocas que se conhecem e se reencontram na
sofreguidão de uma saudade que tardava em ser desfeita.
Isto
aconteceu há anos ou aconteceu há dias. Que importa? O tempo faz o quer de nós
e brinca connosco desde esse dia, encolhe o nosso tempo juntos e estica-o
quando estamos longe.
O
tempo e o espaço deixaram de ser uma realidade física mensurável para ser
alguma coisa que sentimos da forma que eles querem, como eles querem.
Qualquer
distância é enorme quando não te toco e qualquer momento é infinito quando não
estamos juntos. Desde há anos, desse há dias… Quem sabe?